Stan Lee - não há como não ser atingido pelo seu legado


O dia é 12 de novembro de 2018, era umas três da tarde quando um colega colocou num grupo de whatsapp que Stan Lee morrera, minutos depois estava ali um tweet de Marcelo Naranjo, jornalista do Universo Hq, confirmando a informação. Veio um sentimento em mim de tristeza, afinal passei a maior parte da minha vida lendo quadrinhos e o cara foi co-autor dos personagens mais importantes da Marvel. Além da triste notícia, fiquei surpreso com pessoas sem nenhuma relação com histórias em quadrinhos, colocarem nos seus perfis sentimentos de tristeza e lamentações a perda do grande Stan Lee. A obra do artista teve um alcance além dos quadrinhos e foram inúmeras as pessoas atingidas por ela.

É preciso esclarecer algumas coisas. Nos início dos anos 60, Stan Lee e Jack Kirby foram apresentando diversos personagens que até hoje divertem pessoas de todas as idades nas mais diferentes mídias. Naquele tempo as histórias em quadrinhos não tinha o mesmo cuidado que há atualmente. Eram histórias voltadas para o público infantil bem populares. Os desenhistas como Jack Kirby e Steve Ditko chegavam com a história toda desenhada e entregava ao Stan Lee que inseria as falas nos balões e fazia os recordatórios. É por isso que há tanta controvérsias sobre quem teve a maior influência na criação dos personagens. Porém, se isso ocorreu com a maioria, Stan também trouxe as suas propostas de personagens e histórias para que fossem desenhadas. O fato é que há um certo obscurantismo sobre quem criou o que, pode-se afirmar que Stan Lee colaborou com a criação de todos esses heróis.

Stan Lee trouxe várias contribuições e eu gostaria de destacar pelo menos duas delas. Stan Lee não apenas escrevia muito bem, como tinha uma visão de marketing bem avançada. Antes dele, as revistas de heróis tinham o equivalente ao que encontramos nas revistas infantis atuais. Ninguém sabe quem escreve, quem desenha e quem colore. Stanley trouxe os créditos e acrescentava adjetivos a cada artista “foi magistralmente escrita”, “foi incrivelmente desenhada”. As revistas tinha um teor dramático no início de cada história, o autor comunicava-se com o leitor e prendia a sua atenção com a narração do que estava acontecendo, o mesmo valia para o final de cada história. Stan queria que cada história trouxesse um gancho ao final para que o leitor ficasse na expectativa de esperar pela edição seguinte. Ah, e como esquecer do elemento que tanto conquistou o cinema desde 2010: a história de um personagem influenciava a história do outro. Enquanto na Disitinta Concorrente os personagens pouco se encontravam, Stan Lee inseriu o universo compartilhado, os heróis dividiam o mesmo país e portanto iriam se encontrar, cabiam aos artistas e editores acompanharem tudo o que ocorria nas revistas para não citar os acontecimentos das histórias erroneamente.

Não era apenas dentro das histórias em quadrinhos que o escritor sabia vender o seu peixe. Ele desde o início considerava que os personagens da Marvel eram grandes demais para se manterem restritos aos quadrinhos. Stan Lee queria vê-los na TV, na rádio e quem sabe, no cinema! Mas antes disso era preciso engrandecer a Marvel, que saiu de uma pequena empresa que ninguém levava a sério e que por diversas vezes quase chegou a falência, para a marca que é hoje. Stan Lee era visionário mas nunca foi dono da Marvel. A sua grande competência o manteve na empresa nos bons e maus momentos ainda que a mesma tivesse passado por várias mãos. Assim que via alguma abertura, lá estava Stanley com um projeto de série animada em mãos para colocar em prática.

Stan Lee merece ser admirado por sua visão de que os quadrinhos poderiam atingir um número cada vez maior de pessoas, mas não se limitava a isso. Stan Lee desde o início, dedicou a humanizar os seus personagens e inserir ali uma crítica social. Se Batman e Superman era perfeitos moralmente e seus problemas se restringiam aos seus inimigos, o Homem-Aranha não sabia como iria pagar o seu aluguel, o Deus do Trovão, ao retornar a sua forma humana, precisava de um cajado para caminhar, os X-Men eram adolescentes mal vistos e temidos pelo simples fato de serem mutantes, ainda que vivesse arriscando a sua vida em prol de todos, o Demolidor é um advogado cego ... São vários os exemplos em que os seus heróis tinha os seus problemas pessoais para se adaptar e conseguia superá-los. Stan Lee viajava muito divulgando esses incríveis heróis e nessas viagens ele conheceu pessoas e movimentos sociais. Numa dessas viagens, ele teve contato com o movimento negro, ouvindo as suas bandeiras e dificuldades, Stan trouxe uma proposta de herói Negro: o Pantera Negra. A sua proposta não era de um negro sofrido e discriminado. Pantera Negra era o rei da nação mais promissora da África, Wakanda. O país ficava sobre um metal que só existia ali, o Vibranium. Ao estudar as especificidades desse metal, os Wakandanos desenvolveram uma das nações mais tecnológicas do mundo e ainda manteve os seus costumes tribais.

A influência de Stan Lee estava nas suas criações, na forma como ele as divulgava e no seu trabalho de editor. Outros artistas criaram heróis para a Marvel após o Stan Lee e ele estava por lá para sugerir o quanto a representatividade das diversas culturas seria importante. Ele deu pitaco tanto em criações como sobre o rumo que as histórias deveriam levar. Pra uma empresa que passou por tantas dificuldades financeiras, é bem complicado prever quais rumos a Marvel teria migrado sem a presença dele ali. Não apenas a Marvel, mas a própria DC teve que engolir em seco o sucesso de uma editora de fundo de quintal que teve a audácia de vender mais do que ela.

É inegável a influência do escritor em minha vida, mas eu nem quis falar sobre isso por eu já ter publicado algo com essa temática esse ano, o link vai ficar abaixo, mas vê se lê, viu! Os quadrinhos não teriam a mesma popularidade que tem hoje sem Stan Lee. A obra dele estava os valores morais que influenciaram a mim e a diversas crianças do século XX e continua influenciando até hoje. Se atualmente eu estou lendo uma temática bem mais variada, nada disso ocorreria sem um mercado aquecido que favorece o surgimento de diversos artistas para a nona arte. Obrigado Stan Lee, pelo seu legado que contribuiu e contribui para a pessoas que eu sou hoje.

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