Aya de Yopougon 1 - Esqueça tudo o que você sabe sobre África. Este livro vai lhe dar uma outra visão

 


Aya de Yopougon é um gibi escrito pela marfinense Marguerite Abouet e ilustrado pelo francês Clément Oubrerie. Esse é o primeiro volume de uma série que traz elementos auto-biográficos e ficcionais que mostram o dia a dia de uma jovem da Costa do Marfim. O gibi da editora Gallimard Jeunesse é vencedor do Prêmio Angouleme de 2006 na categoria de Melhor Álbum de Estréia e é publicado no Brasil desde 2009 e em 2020 o seu primeiro álbum chegou a quarta edição pela Editora L&PM.

Aya mora na cidade de Abidjan na Costa do Marfim, ela reside mais especificamente no bairro de Yopougon dos anos 70. A personagem que dá nome ao título é a narradora da história e é uma pessoa idealista. Diferente de várias mulheres do seu bairro, ela não tem a pretensão de ser a dona de casa de um marido rico, mas prefere conquistar a melhora da qualidade de vida a partir dos méritos dos seus estudos. 

Entretanto Yopougon não tem ali oportunidades para ascendência social e talvez por isso os seus habitantes se contentem em ser o que é possível e julgue uma utopia apostar em conquistas através de títulos acadêmicos. 

Uma das amigas de Aya é Bintou, uma garota que adora dançar e está interessada no playboy inútil chamado Moussa. Ele é um garoto que têm como objetivo de vida apenas torrar a fortuna do pai e se divertir com garotas. Entretanto o pai de Bintou é um linha dura que vigia seus filhos com rigor. Por ter uma vida tão sufocante, Bintou apronta das suas criando várias estratégias para dar as suas escapulidas para ir a festas ou na praça do mercado à noite, um local sem iluminação e repleto de mesas enormes onde os casais se encontravam para namorar. O fruto dessa relação dionisíaca não poderia ser outro além da gravidez e os problemas que isso traz quando ela não é planejada. 



Apesar do enredo pecar pela falta de originalidade, o roteiro de Marguerite Abouet é atraente pela sutileza com que a roteirista utiliza o humor e a denúncia de problemas sociais como o machismo e as diferenças de classe. A história é de fácil identificação e tem um jeito cativante de conduzir a narrativa. 

O gibi traz a oportunidade de conhecer detalhes de uma cultura que ao mesmo tempo é tão diferente e parecida com a nossa. A Costa do Marfim tem o Francês como língua imposta mas os seus habitantes utilizam expressões próprias de lá, algumas delas ficaram na tradução de Júlia da Rosa Simões com as repectivas notas explicativas no fim da página. Além da língua, a indumentária e a culinária local é fascinante. É uma sensação agradável vermos pessoas pretas e explorando por exemplo a potencialidade da beleza do seu cabelo com toda a naturalidade, já que um país racista como o Brasil, não alisar o cabelo é um ato de resistência. 

Eu nasci em 1979 então eu não vivi a década de 70 mas ainda nos anos 80 era possível encontrar similaridades principalmente entre Yopugon e a cidade dos meus pais no interior do Piauí dessa época já que o bairro de Aya parece muito com várias pequenas cidades do Brasil, as suas ruas sem calçamento, a alegria das festas, a vizinhança acolhedora e o mesmo jeito de viver simples que consegue extrair tantas alegrias. Eu consegui me transportar facilmente a minha infância nos anos 80 e muitas vezes as lembranças me faziam me perder da história. Além disso, esse tipo de narrativas possibilita uma visão além do clichê de sofrimento, miséria e guerras que geralmente ocupam o nosso imaginário quando ouvimos falar de qualquer lugar do continente africano.

Os desenhos de Clément Oubrerie tem um estilo cartunesco mas que tem uma grande sintonia com o roteiro, isso possibilita explorar o movimento dos personagens, o traço é tão bom que é possível visualizar o movimento de dança durante as festas. 

Se Aya utiliza de uma sutileza irônica nas suas palavras, o desenhista também passa isso no olhar dela, como na situação em que a protagonista precisa sair com o irmão sem assunto para salvar a sua amiga e ela está visivelmente entediada com a falta de assunto do rapaz mas ainda assim Aya procura incentivá-lo a tomar atitudes sobre o próprio futuro. Eu destaco na arte o uso das cores que conseguem explicitar bem o horário dos acontecimentos e as diferentes tonalidades se adequam ao clima emocional dos acontecimentos.

Aya de Yopougon é uma história nada original de relaciomento juvenil mas permite que o leitor conheça a riqueza de uma cultura com tantas similaridades e diferenças da nossa. A protagonista é uma personagem forte e cativante que narra uma história que possibilita reflexões com críticas sociais. O quaddinho ajuda a suprir a parca informação inviesada que temos sobre o continente africano. 

Compre aqui


Ficha técnica:

Publicado em: setembro de 2009

Editora: L&PM
Traduzido por: Júlia da Rosa Simões
Número de páginas: 118
Formato: (16 x 23 cm)
Colorido/Lombada quadrada/capa cartão com orelhas

Preço de capa: R$ 38,90


Leia também:

Três Sombras - o premiado suspense de Cyril Pedrosa

Marighella #Livre - Contos de resistência

Fala, Maria - Um romance gráfico sobre o autismo

Eu Matei Adolf Hitler - uma surpreendente ficção de Jason

Para Todos os Tipos de Vermes - uma estranha distopia do selo Narrativas Periféricas



Comentários