A Marcha Livro 1 - um instrumento de luta não violenta para combater o racismo


A Marcha é uma trilogia que conta a história do deputado estadunidense John Lewis antes da emblemática marcha de 1963 que ficou conhecida pelo discurso de Martin Luther King "Eu tenho um sonho". Aqui John Lewis conta detalhes da sua infância, o desafio de se manter nos estudos, a contribuição da Primeira Igreja Batista e como conheceu as ideias de "resistência passiva" e "ação não violenta". Essa primeira parte foi lançada em 2018 pela Editora Nemo e originalmente foi o promeiro gibi a vencer o National Book Award, uma das grandes premiações literárias dos EUA.

John Lewis em seu trabalho de legislador, além do costumeiro trabalho, também recebe estudantes em seu gabinete e, numa dessas visistas, ele resolve contar a sua história. A história inicia nos anos 40, quando Lewis era uma criança que vivia numa fazenda. Desde muito cedo, ele desenvolvera o gosto pela leitura e o livro que gerou um grande impacto em sua vida foi a Bíblia Cristã. A partir daí, ele alimentou o sonho de ser pastor e dramatizava isso com as galinhas que ele ajudava a criar.

Nessa época, o garoto conheceu o racismo nos olhares das pessoas brancas, um misto de raiva e medo motivados por algo que ele não fazia ideia. Uma outra situação marcante foi o início da sua vida escolar, nessa época as escolas eram segregadas e a diferença entre a qualidade dos ônibus era gritante nas esolas de negros e brancos. Aliás, a segregação era uma constante nessa época, inclusive nas igrejas. Havia igrejas para brancos e negros.

John Lewis, incomodado com essas diferenças entre a nítida separação das pessoas por cores, encontrou num programa de rádio o consolo. Lá ele teve contato com a pregação do pastor Martin Luther King, diferente da maioria dos pastores brancos, Luther King pregava a necessidade de fazer algo para mudar essa situação em vez de apenas aceitar passivamente as diferenças de condições como se toda injustiça tivesse um consentimento divino.

John Lewis tornou-se jovem e conseguiu adentrar em universidade que aceitasse estudantes negros. Nesse período da juventude, ele conseguiu conhecer pessoalmente Martin Luther King e a suas diretrizes de manifestos não violentos. John Lewis percebeu que orações são necessárias para o espírito mas a mudança de uma realidade se dá pela ação. Assim, após fazer uma espécie de workshop de humilhação, em que os grupos de estudo de ação não violenta simulava toda a humilhação que eles viriam a passar e como eles teriam que se manter passivos, ele resolveu ir à campo e protestar.

O local dos protestos eram lanchonetes que não atendiam negros que se sentassem em cadeiras do balcão. Assim um pequeno grupo ia até lá e faziam o pedido sentados nas cadeiras proibidas. Com a recusa ao atendimento, eles permaneciam onde estavam e o líder do grupo pedia para falar com o gerente. Nisso, eles eram xingados de todas as formar pelos clientes brancos e algumas vezes a lanchonete se via obrigada a fechar as portas para que eles fossem embora. Eles sentiam na pele o quanto protestos pacíficos incomodavam e conseguiam irritar os racistas. Houve momentos em que eles apanhavam e o tumulto trazia a polícia ao recinto e os levavam presos, por querer comprar lanche e apanhar em silêncio.


O absurdo dessa reação além da farsa de um julgamento, em que o juiz fingia ouvir a defesa dos acusados e logo os condenava a prisão, gerou engajamento. O movimento estudantil, igrejas e grupos sociais divulgavam os protestos e cada vez mais pessoas resolveram se inserir na luta pelos direitos civis.

Eu senti a necessidade de detalhar demais o enredo e trazer spoilers da obra para mostrar o potencial revolucionário de protestos não violentos coordenados. O Brasil enfrenta uma crescente insatisfação com os políticos. Isso leva ao descontentamento da população com a democracia e ao absurdo de se identificar com ideias extremistas. Assim o número de pessoas que votam nulo e em branco só cresce no nosso país, essa atitude inútil possibilita que a escolha tenda a ir para os lados extremos que são capazes de despertar paixões irracionais. No Brasil há algumas categorias de voto: os de protesto que é um tipo de voto inútil que elege pessoas despreparadas que têm apenas o deboche e frases de efeito a oferecer; há os que sempre vão votar de acordo com uma liderança ou a venda de votos pura e simples e finalmente aquelas pessoas que irão pesquisar o seu candidato e escolher de acordo com aquilo que eles propõe defender.

A ideia de que a democracia resolve todos os problemas no estalar de dedos esconde o seu real propósito: encontrar soluções para melhorar uma determinada situação que afeta a todos e principalmente as maiores vítimas de situações injustas. Nem John Lewis e nem Martin Luther King acabaram com o racismo nos Estados Umidos, taí o presidente que não me deixa mentir, mas a atuação de ambos levou a população a refletir e certamente o país dos anos 50 é muito diferente do país dos dias atuais. Esse é o papel de ter um Congresso e ter lidera ças com diferentes representatividades no Congresso.

Já deu pra perceber o quanto A Marcha Livro 1 me inpactou? Não?!! O roteiro de John Lewis e Andrew Aydin mostra um racismo nu e cru que gerou em mim muito desconforto e sentimento de revolta em vários momentos. Porém os autores mostraram que há caminhos para minimizar e que é possível mobilizar. Esse sentimento de esperança me acalenta e faz com que eu acredite que seja nos EUA e seja no Brasil, existem representantes que merecem ter a sua cadeira no parlamento. Para isso, eu acho que as eleições para o legislativo deveria em ser em épocas diferentes para eleição no executivo, para incentivar os eleitores a procurar candidatos melhores, já que na real, os eleitores se envolvem mesmo é nas eleições do executivo. Quem sabe isso poderia levar as pessoas a eleger menos pessoas que só tem piadas a oferecer ou youtubers com opinião camufaladas de "verdades que ninguém quer divulgar".

Os desenhos de Nate Powell são ótimos e ele tem uma excelente habilidade em prender a atenção do leitor, logo de início ele mostra uma atuação policial num protesto pacífico que já instiga o leitor para daí iniciar a história com a visita dos estudantes ao gabinete. Os desenhos em preto e branco variam de um estilo bem realista a alguns momentos cartunescos mas todos sempre expressivos.

O maior sentimento quando terminei de ler A Marcha foi "por que eu demorei tanto pra ler esse livro?" Além de ser uma excelente narrativa em quadrinhos, mais do que nunca esse livro merece ser lido e discutido nos mais variados grupos.



Ficha técnica:
Número de páginas: 128
Formato: (16,5 x 24 cm)
Preto e branco/Lombada quadrada

Preço de capa: R$ 44,90

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