ESSE TEXTO CONTÉM SPOILERS
A partir dessa edição, algumas das edições originais de Adam Wild lançadas na Itália trazem arco de histórias em duas partes. Como a Editora Saicã publica um encadernado com algumas edições aqui no Brasil, esse primeiro arco foi publicado nas edições 4 e 5. O arco que dá título a esse texto acontece em Londres numa reunião de milionários que fazem parte da Royal Geographical Society. Wild foi convidado por ser uma referência de conhecimento em África, região que esconde tesouros sobre os quais o público desse grupo tem muito interesse em explorar. Além do arco, eu realmente precisava comentar sobre a história fechada que dá título a edição 4 brasileira "Os Demônios do Kilimanjaro", uma história que chamou-me a atenção quanto ao posicionamento do herói diante da situação da trama. A Editora Saicã publicou essas edições da Sergio Bonelli Editore em dezembro de 2021 e em março de 2023.
Até essa edição eu estava me divertindo muito com um herói que vai a África matar escravista europeu. É bem verdade que ele é mais um branco salvador, contudo como há vários exemplos de personagens negros muito mal caracterizados por roteiristas brancos, é melhor que Adam Wild seja um Europeu. Contudo é bem provável que a cultura do autor se sobressaia em algum momento, que foi exatamente o que ocorreu em "Os Demônios do Kilimanjaro".
Adam Wild segue cumprindo o seu contrato de acompanhar e defender Narcy no interior do continente africano. Para cumprir uma promessa de família, Narcy precisa escalar o monte Kilimanjaro para colocar uma cruz no topo. No caminho, eles descobrem que outras expedições já tentaram e conseguiram apenas fracasso com morte nesse intento. Contudo eles, com apoio espiritual de outras etnias, persistem nesse objetivo ainda que tenham que enfrentar os "espíritos" da região. Wild descobre que na verdade há uma comunidade que habita ali há séculos e tem o monte como um lugar sagrado, por isso eles não querem que exploradores subam ali, até porque um aventureiro chama o outro e logo um monte de europeu estaria por ali. Como um típico membro da cultura branca, dessa vez Wild ignorou completamente a devoção daquele povo e, junto com seus aliados, executam os moradores e concluem a aventura com piadinhas. Esse é um exemplo de que o personagem reflete os valores do seu autor. O que indigna o protagonista são pessoas brancas que fazem comércio com a vida das pessoas, agora se um local é ótimo para uma escalada, coitado de quem vai se impor no caminho de Adam Wild, um comportamento que não soa nada contraditório, nem para o autor e nem para boa parte dos fãs do personagem, mas que para mim foi desagradável.
A seguir, o arco que dá título a esse texto inicia em um encontro da Royal Geographical Society em Londres. Uma sociedade que se denomina como de cientistas mas onde o racismo se manifesta na sua forma mais direta, por exemplo quando Adam Wild inicia a sua palestra. Nesse momento, fica difícil manter qualquer etiqueta e o herói soca o burguês que vomitava os seus preconceitos com ar de deboche. Em meios a essa confusão, Wild descobre que o real motivo de ter sido convidado ali é para participar de uma excursão no sul da África afim de encontrar tesouros.
A primeira parte do arco, tem o destaque em Amina. A princesa além de colocar o herói no seu devido lugar com a sua postura confiante, consegue surpreender a elite britânica não apenas pela sua beleza, mas também por ter uma postura de alguém que se vê à altura de todos que ali estão, ainda que a sua cultura seja bem diferente dos que ali estão. O roteirista Gianfranco Manfredi, ao mesmo tempo que traz uma mulher que não se permite subjugar a nenhum homem, explora o corpo não só dela mas de outras personagens em momentos de sensualidade, ainda que ele insira essa crítica na trama quando ele traz um personagem que é um fotógrafo que ganha dinheiro com fotos de mulheres nuas sem consentimento. Por mais que o autor tenha uma intenção de trazer uma proposta crítica com a ideia de igualdade entre gêneros, há momentos em que os corpos nus das mulheres ficaram sem nenhuma justificativa para agradar o seu público que é majoritariamente masculino.
Algumas situações e personagens da obra são reais e chocam, um exemplo disso é quando a gente vê que há no zoológico da história uma ala com pessoas negras. Os zoológicos humanos realmente existiram em Londres até 1958. Uma situação que levou Amina a externalizar a sua indignação. Apesar que durante a leitura eu quisesse que ela tivesse feito ainda mais como destruir completamente aquela ala ridicula, ela resolve o conflito de uma outra forma que choca os personagens brancos pela ousadia.
A segunda parte, traz um mistério sobre quem libertou um tigre do zoológico, aqui o destaque retorna a Adam Wild que protagoniza uma excelente história que conclui com uma aventura empolgante.
O traço da primeira parte é do sérvio Darko Petrovic que tem um traço muito detalhado e que utiliza de cores intensas com destaque ao preto. Por isso a leitura aqui corre mais lenta para que a gente possa apreciar os detalhes de cada quadrinho. Já na segunda parte o lápis além de Perovic, conta com os italianos Luca Casalanguida e Marcello Mangiatini que, por terem um estilo mais simples, possibilita trabalhar melhor o movimento dos personagens já que o final é bem dinâmico com a caça ao tigre.
Adam Wild Na Selva Metropolitana e Incêndio no Zoológico compõe um excelente arco que soube dar o destaque merecido a princesa Amina, que escandaliza a nobreza londrina por causa da cor da sua pele e por a sua atitude com altivez similar a burguesia. Além disso a situação de mistério e as surpresas dela decorrente possibilitam uma história divertida e muito bem desenhada.
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