Além das Resenhas - Hulk Canário Verde

 


A Morte do Super-Homem em novembro de 1993 mecheu muito comigo como leitor, foi ali que acendeu a ideia de que eu deveria passar a comprar lançamento de quadrinhos de heróis em vez de apenas quadrinhos em sebos. Com uma outra novidade bombástica (o Batman ficaria aleijado!), eu decidi passar a comprar títulos mensalmente e por isso comecei a pegar todas as Liga da Justiça e Batman a partir da número 3 em outubro de 1994 (sim, a minha decisão se deu após a primeira edição).  Porém se a DC já anunciava grandes eventos, a Marvel não queria ficar por baixo. Naquela época estávamos prestes a ver Thanos com os poderes ilimitados das Jóias do Infinito em Desafio Infinito. A revista do Hulk iria mostrar as consequências dessa saga nas suas páginas que começaria a partir da edição 141 (março de 1995) com a história que dá título a esse texto, nessa época eu era um garoto de 15 anos. Isso ocorreu no momento certo já que no Universo Marvel eu já estava comprando as Guerras Secretas que vinha sendo republicada em A Teia do Aranha, pouco antes de concluir as Guerras Secretas eu passaria a comprar a mini-série Desafio Infinito junto com a revista mensal do Hulk. Quase 28 anos se passaram e venho seguido o personagem desde então e decidi expor melhor o quanto isso se relaciona a minha vida e como está a sina de ser um colecionador aos 43 anos. 

Eu resolvi comprar quadrinhos em sebos primeiro por serem mais baratos e depois por ter uma variedade bem maior que em bancas comuns. Assim mensalmente eu comprava quadrinhos de personagens diferentes sem a intenção de buscar completar coleção e nem sequer completar arcos. Eu queria mesmo era conhecer um pouco de tudo daquele universo sensacional e não ser um colecionador habitual que tem fases completas de personagens. Eu não fazia a mínima ideia de qual era o meu personagem preferido, mas uma coisa eu sabia: não era o Hulk! Como alguém poderia gostar de um monstro burro que mal sabia falar? Que graça havia nisso? Aliás ele realmente era um herói? 

Dessas edições aleatórias que eu estava pegando, eu comprei uma revista solta do Hulk em lançamento. Agora Bruce Banner e Hulk estavam fundidos num corpo e numa mente só! Aí a coisa ficou interessante! A inteligência de Bruce Banner com a força incrível do Monstro. Por isso, quando eu vi que as Guerras Secretas estava acabando e eu precisava decidir qual personagem eu iria colecionar na Marvel, Hulk passou a ser um personagem possível até que passou a ser minha decisão consolidada! 

Nessa época, quem estava escrevendo o Gigante Esmeralda era o Peter David, um roteirista que com muita frequência evitava se limitar aos embates rasos de herói contra vilão. As suas histórias são permeadas de crítica social e ele buscava trabalhar a constituição da personalidade daquele ser. A partir das descobertas dos traumas de Banner, o Maciel adolescente passou a se descobrir e se identificar. Hulk era uma pessoa que não tinha como se defender fisicamente mas a sua irritação sem controle o tornava uma pessoa perigosa. Essa é uma característica que faz parte de mim até hoje mas que eu já pude compreender melhor tanto nas leituras que fiz como dentro da psicoterapia. David mostrou para um adolescente que Hulk era na verdade um ser incompreendido visto por todos como um idiota ou uma ameaça. É claro que vários outros autores já haviam dito o mesmo mas eu estava lendo aquilo pela primeira vez e me fascinando com essas descobertas! 

Os anos passaram e no início da fase adulta tentei passar a me aproxima da literatura e limitar a leitura de quadrinhos mas não queria abandonar aquele universo e passei um bom tempo lendo um mínimo de super-heróis e no máximo uma coisa ou outra do selo adulto Vertigo da DC. Hoje apesar de eu aceitar a minha condição de consumidor de quadrinhos sem pudor, eu já consigo identificar as várias possibilidades narrativas que os quadrinhos dispõem além dos super-heróis. A minha vida como leitor passou por momentos longos em que eu não tinha com quem conversar sobre nona arte. Eu tive um início em que um amigo me introduziu a esse universo e fui conhecendo alguns poucos leitores, os anos foram passando e ou eu não tinha mais o contato dessas pessoas ou amigos leitores passavam para outros meios de entretenimento. No início desse século, a revista Wizard da Panini foi a fonte que eu tinha de informações sobre quadrinhos, porém ela chegou ao fim. Nessa mesma época, a internet estava chegando a minha casa e com o passar dos anos invadindo cada vez mais a vida dos brasileiros. Em meados dos anos 10, é que eu comecei a consumir canais de quadrinhos já que foi só aí que eu pude ter acesso ao mundo da internet ilimitada! No YouTube eu encontrei onde me informar e no Facebook comecei a fazer parte de grupos de quadrinhos! 

Com tanta informação disponível, estava na hora de eu passar a comprar coisas interessantes fora dos univeros Marvel e DC  e eu percebi que o que eu pensava que sabia sobre quadrinhos na verdade era insignificante. Assim eu decidi que aos poucos eu iria comprar os quadrinhos e autores considerados referência na Nona Arte e mais aqueles outros que despertava o meu interesse! 

Cheguei finalmente ao ano de 2023 e muita coisa mudou e consequentemente a maneira como eu me relaciono com os quadrinhos. Os grupos de leitores se tornaram insuportáveis, com tanta gente falando absurdos ou distorcendo inclusive aquilo que leu. É desagradável perceber a quantidade de pessoas que não fazem ideia do que são metáforas e por isso nem percebe isso nas obras. As manifestações artísticas tendem a ter nos seus destaques obras com ideias progressistas até porque é função da arte questionar as regras sociais. Nos grupos de leitores ou se ignora isso deliberadamente ou há gente demais que só olham desenhos nas histórias, fazendo com que por lá se tenham discussões acaloradas de algo que nem deveria ser uma polêmica. Sério, chega ao ponto de ter que explicar a metáfora dos X-Men sobre a perseguição a minorias. 

Para piorar, o mercado de quadrinhos se vê encolhendo o seu público cada vez mais. Hoje leitor de quadrinhos é algo tão elitista como participar de um clube de vinho. Por isso, esse clube amplia o seu nível de exigência e pede quadrinhos cada vez mais luxuosos. Uma boa parte desse pequeno público não quer ter várias edições de uma obra, é preciso que haja o menor número de edições possível pra ter a obra de maneira integral não importa o quanto isso vai custar. Sobre isso tem um texto do tradutor Érico Assis (clique aqui) só pra não dizer que isso é respeito meu. Os influenciadores de quadrinhos que costumam ser muitos ligados ao mercado fazem coro para essa goumertização nas edições que só restringe o acesso a leitores, os curiosos então só olham de longe já que os preços são assustadores. 

O Maciel de hoje é uma pessoa que ainda tem o Hulk como um personagem de apego e até por isso ainda quer manter contato com o universo de super-heróis. Se em algum momento eu quis ter na minha coleção as grandes referências de quadrinhos de todas as eras ou continentes, hoje eu vejo que isso não é para mim e sim para pessoas que tem uma renda bem superior a minha. Além disso, eu venho acumulado decepções sobre obras muito elogiadas e que achei uma leitura regular. Os quadrinhos é uma mídia cuja expressão eu continuo admirando mas que eu já desisti da ideia de ser um grande entendedor do assunto. Apesar disso, eu continuo por aqui no blog dando opiniões que talvez passe a ideia de que eu saiba mais do que eu realmente sei mas saibam que é apenas um exercício opinativo pra eu evitar passar mais tempo falando de política nas redes sociais. 

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