A Marcha Livro 3 - John Lewis e Martin Luther King em uma História de Luta pela Liberdade

 


A luta por representatividade das categorias que estão fora de uma posição de poder é constante. Contudo é imprescindível conhecer momentos em que algumas batalhas foram bem sucedidas. Esse quadrinho é dividido em três edições e na última traz a luta de grupos organizados pela inclusão dos negros no direito ao voto nos EUA. Essa luta infelizmente está longe de ter um sentido apenas conotativo, pessoas foram torturadas, mutiladas ou mortas para ter um apoio da população suficiente para conquistar suas reivindicações. Em novembro de 2021 a Editora Nemo publicou o último volume desse quadrinho que faz parte de uma série que foi a primeira a vencer o National Book Award. 

Uma bomba explode dentro de uma igreja evangélica matando crianças que estavam por lá. Os agressores são motivados por um ódio que tem como objeto a diferença da cor da pele. Nas ruas, jovens brancos armados perseguem negros pelo motivo único: a diferença da cor da pele. Isso são situações comuns ocorridas nos EUA dos anos 60. Nesse período o Estado do Alabama elegeu um governador que pregava a "segregação para sempre" e usava frases de efeito como "o que esse país precisa mesmo é de velórios de primeira". Nessa hora não tem como não lembrar das diversas frases ditas pelo presidente do Brasil eleito em 2018: "Minorias têm que se curvar as maiorias" e demais absurdos sobre matar pessoas. 

O roteirista Andrew Aydin a partir dos relatos narrados por John Lewis conta como foram os acontecimentos que possibilitaram aos negros a efetivação do direito ao voto. Os grupos eram organizados com a proposta de protestos não violentos que não impediram de serem abordados com muita truculência pela polícia sem que ela precisasse se justificar. Isso ocorreu após grupos de pessoas negras tentarem se inscreverem para poder votar, nesse momento diversos absurdos ocorriam, como ter que ficar em filas durante horas sem poder sair pra nada, os poucos que ainda entravam eram submetidas a perguntas dificeis que nada tinha a ver com o documento em si. 

Essa é uma edição cujo foco inevitavelmente vai estar na complicada política estadunidense. Por isso o ritmo da narrativa não tem o mesmo impacto emocional e nem a mesma velocidade que as edições anteriores. Isso permite que a gente conheça melhor esse aspecto de como funciona os trâmites de uma proposta de lei mas exige do leitor uma maior atenção. Porém nem tudo é tédio, Aydin sabe colocar algumas situações revoltantes espalhadas pela história para fazer com que a emoção da leitura mantenha o leitor motivado.

Os desenhos de Nate Powell além de lindos contrabuem com a narrativa em vários aspectos: como o foco nas cenas as vezes em plano mais abertos e as vezes só com a expressão facial e os diferentes gradeamentos das páginas preenchidos com cenas cheias de ação e movimento. Essa edição causou um impacto particular nos momentos que ele insere a arte nos balões de fala, como num momento de morte, o sangue espirra e aparece um balão de fala manchado. Isso sem mencionar nas onomatopéias que em vários momentos fazem parte da cena ou a fonte simula o ritmo do som que está ali representados por palavras. 

Sobre a edição, eu gostaria que houvesse mais notas. Um exemplo foi quando a história menciona os "dixiecratas". Eu tive que ir ao dicionário de inglês pra descobrir que "dixie" é como são chamados alguns Estados do sul dos EUA, algo que facilmente caberia numa nota. Um outro detalhe são as músicas que estão em inglês. Eu não vejo problema algum de elas estarem na língua original. O que eu questiono é o quanto essas letras são relevantes para a narrativa. Será que as letras são relevantes pra compreensão do acontecimento ali mostrado? O fato é que, tirando quando está um trecho do hino do país, em nenhum outro momento há alguma referência sobre que música é aquela. Particularmente eu acharia interessante vir como extra ao final do livro a tradução dos versos por página, mencionando também o título e autor das músicas Eu já vi isso ocorrer em outros quadrinhos e fiquei com a impressão que nessa obra isso seria ainda mais necessário. 

A Marcha Livro 3 é um excelente quadrinho que encerra com o mesmo brilhantismo que já vinha sendo mostrado nas duas edições anteriores. Ainda que a narrativa tenha ficado mais densa com o detalhamento do processo político, eu entendi que era necessário contar a história daquela forma, até porque esse é um quadrinho político. Isso não impediu de trazer momentos de grandes emoções, com um belo discurso na conclusão e um final com uma mensagem muito relevante. A série A Marcha mostra diferenças com o racismo praticado no Brasil. É claro que é um absurdo medir onde os negros sofrem mais, porém é fácil perceber que tanto lá como cá, a exploração da mão de obra negra serviu pra explorar muita gente e isso acaba gerando o interesse em fazer com que impor essa condição de inferioridade seja tão relevantes para as elites. 

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Ficha técnica: 

Publicado em: novembro de 2021

Editora: Nemo
Licenciador: John Lewis/Andrew Aydin
Categoria: Minissérie
Gênero: Alternativo
Status: Série completa
Número de páginas: 256
Formato: (16,5 x 24 cm)
Preto e branco/Lombada quadrada

Preço de capa: R$ 69,80

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