Esse quadrinho é sobre a relação de Fábio e Giovanni, dois irmãos que há muito tempo não se viam e que uma tragédia possibilitou o reencontro e uma viagem de retorno de Fábio (que estava morando na França) para a Itália, uma viagem que vai passar por dolorosas lembranças que levaram ao rompimento familiar. A obra foi laureada com o prêmio Fauve d'Or (a categoria mais importante) no festival de Angouleme. O quadrinho da editora Delcourt foi publicada por aqui em novembro de 2021 pela Editora Devir.
O protagonista Fábio é um lutador de boxe durão tanto nos rinques quanto no controle das suas emoções. Uma habilidade que ele desenvolveu para lidar com sentimentos tão intensos que o levou a sair de casa. Por isso o reencontro com seu irmão é tenso e foi preciso um motivo realmente importante para convencê-lo a retornar, durante a viagem passamos a conhecer os detalhes da vida de ambos e o ciclo de acontecimentos que se sucederam após Fábio abandonar a sua família.
Alfred, o autor da obra, propõe um quadrinho despretensioso tanto no roteiro quanto no seu traço. Contudo isso não torna a obra menos tocante. Os seus personagens trazem consigo uma dose de humanidade que o tornam complexos e as decisões tomadas por eles acabam sendo compreendidas pelos leitores à medida que avança na leitura. Fábio é um protagonista antipático que só não afasta o leitor completamente por aparecer na história um personagem inesperado, a relação que estabelece entre eles possibilita que a gente comece a acessar a alma daquele pugilista que certamente não se resume a luvas socando um saco de areia.
O traço de Alfred é simples e torna-se admirável por conseguir gerar ainda assim risos, raiva, apreensão e alívio. Além disso toda a narrativa é construída com doses de silêncio que possibilita que o leitor perceba o quão longa a viagem se torna principalmente por ter um silêncio perturbador, a ausência de barulho parece instigar que os personagens conversem sobre os diversos incômodos que passaram anos sufocados. É surpreendente o quanto um artista consegue expressar tanto com uma arte que a primeira vista não tem nada demais. Eu destaco as cores principalmente dos flashbacks que conseguem deixar a arte muito diferente afim de passar a sensação de lembrança do personagem e como elas aparecem para substituir imagens tão dolorosas por outras agradáveis, o que nos leva a entender como Fábio foi moldando-se para tornar a pessoa que ele é.
A história ocorre durante e após a ditadura de Mussolini, por isso o aspecto político vai assumir grande relevância até porque o posicionamento contrário e a favor ao governo fascista vai dividir a família e ser assim uma chave para entender a relação entre eles. O quadrinho não se propõe a ser uma análise histórica porém as sutilezas desse recorte no tempo permite ver ali algumas características de uma triste época em que a Itália esteve sob julgo de um Estado autoritário.
Como Antes é um ótimo quadrinho que consegue tocar dentro da simplicidade dos elementos narrativos. O autor evita criar uma dramaticidade intensa e traz uma história simples e tocante como tantas outras que a gente escuta por aí. A proposta de tocar pela sua simplicidade provavelmente foi o que mais tocou o júri do Angouleme mas que a mim não tocou com a mesma intensidade.
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