Primavera em Tchernóbil - o quadrinho documentário sobre a experiência de voltar ao local do desastre 20 anos depois

 

Um homem sozinho em meio a uma floresta e ao alto uma floresta morta.

Esse é um quadrinho documentário que relata como é a experiência de retornar a cidade de Tchernóbil 20 anos depois do acidente nuclear que abalou não só a Ucrânia mas que acabou tendo repercussão direta no restante do continente asiático e na Europa. Essa é uma graphic novel do francês Emmanuel Lepage, que a Editora Geektopia publicou em 2020. 

Ao mesmo tempo em que o álbum é um documentário, é também um relato pessoal de como é adentrar num local que ainda hoje representa riscos para poder retratar a sua percepção de como é estar ali para outras pessoas. Assim, um grupo de artistas diversos tais como músicos, fotógrafos, pintores ... resolveram ir até o local onde em 1986 um fenômeno transformou completamente todo um ecossistema, a associação de desenh'ativistas resolve sugerir o nome de Lepage para representá-los que, pouco antes da viagem descobre um incômodo problema na sua mão, que fazia com que desenhar fosse um ato doloroso. Ainda assim o artista resolve ir, mesmo sabendo que, por ser uma área em que a radiação ainda estava presente, ele poderia não retornar de lá. 

Ir a Tchernóbil é um risco tamanho por ser uma área em que tudo pode estar radioativo e por isso o contador geiger está sempre a mão. É de se perguntar se vale a pena tamanho sacrifício. Para esse grupo de artistas o que os motiva é levar para as pessoas como é a sensação de estar ali de uma maneira bem mais sensível do que uma simples descrição. Para estar ali o medo de morrer é a maior das dificuldades, contudo há várias outras: poucas pessoas moram ali já que a população teve que ser evacuada, qualquer alimento pode conter radiação e tem também a barreira da língua já que na região se fala ucraniano e russo. 

Mesmo com todas as dificuldades, o autor consegue fazer com que a gente sinta os sentimentos contrastantes que ele sentiu durante a sua permanência ali. Ele inicialmente situa a situação do país, a preparação para a viagem e, ao chegar lá, tanto o traço quanto o texto é permeado sobre diversas reflexões que o ambiente gera. As usinas nucleares na Ucrânia era uma maneira de mostrar naquele mundo polarizado entre capitalismo e socialismo, que era possível se deleitar com as benezes trazidas pelo avanço tecnológico, assim junto com as usinas, foram construídos diversos prédios para que o povo pudesse aproveitar daquilo e serviria como propaganda sobre as benezes do mundo socialista, do sonho sobrou a frustração de um plano que deu muito errado e a beleza de um elefante branco no meio do nada. 

Lapage chegou no local com a expectativa de retratar um território morto e os seus desenhos em preto, branco e muito cinza mostra isso muito bem, contudo quanto mais ele se adentra na Ucrânia, ele percebe que não é só a morte o que ele encontra e ele passa a conviver com sensações agradáveis que incomoda a consciência ainda que o barulho do medidor geiger o lembre a todo momento do perigo constante que uma simples poeira pode trazer a sua vida. O mais incrível é que nós leitores sentimos junto tudo isso! O detalhismo do traço do artista nos transporta àquele local e nos encanta perceber que a vida encontra um meio de estar presente mesmo em meio de um desastre causado pela prepotência humana. 

Primavera em Tchernóbil é um quadrinho que em si já é um presente pelo tanto de emoções que ele nos proporciona, por isso seja para si ou para alguma pessoa querida, vale a pena que esse presente chegue as mãos de cada vez mais pessoas. Uma história que inicia como um documento histórico mas que finaliza com uma reflexão profunda sobre a convivência do homem com a natureza. O principal mérito da obra é possibilitar ao leitor sentir um pouco do que é estar hoje em Tchernóbil, já que toda a emoção do artista estar muito bem explícitas seja no texto, no traço ou nas cores utilizadas. Esse é um presente pra qualquer leitor, seja ele um grande apreciador de quadrinhos ou não.

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Ficha técnica: 

Publicado em: julho de 2020

Tradução: Fernando Paz 


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