Tina Respeito - a graphic novel que mostra o desafio em ser mulher



Antes da graphic MSP Tina Respeito está disponível para venda, o gibi já se tornara polêmico. Quando o editor da obra, Sidney Gusman compartilhou a capa, apareceu memes com críticas. Elas apontavam o fato de Tina aparecer sem roupas justas e uma silhueta definida na altura dos seios. Em outras palavras, se a personagem não fosse sexy, também não representava a figura que esses críticos imaginavam dela. O mais irônico é que a temática do quadrinho é sobre essa objetificação da mulher na sociedade.

Tina é uma jornalista que inicia a sua carreira, que coincide com a entrada na vida adulta. Os seus pais ainda estavam se acostumando com a ideia e ainda mantém toda a preocupação que se espera de uma adolescente. Entretanto, as preocupações com a segurança não são exageradas, logo a gente percebe que as mulheres além da preocupação com a violência que pode ocorrer com qualquer um, precisam se precaver com uma ameaça bem pior, o risco de violência sexual.
Ainda que a obra não fale sobre isso de uma forma explícita, a autora Fefê Torquato insere a temática no cotidiano da personagem e mostra o quanto isso faz tão parte da sua vida como tomar café da manhã ou ir para o trabalho.

Além disso, o enredo traz o início da carreira jornalística de Tina cuja inexperiência a coloca em situações inusitadas e divertidas no ambiente de trabalho, coisas que a bagagem acadêmica não são capazes de resolver por si. Quem nunca se viu numa situação de estar perdido sem saber ao certo que material utilizar ou perceber que de repente estava lidando com trabalho excessivo? O primeiro emprego é barra e sempre nos traz lembranças constrangedoras.

Contudo a nossa vida profissional exige de nós uma postura seja de se submeter ao que as pessoas esperam da gente ou de nós impormos uma atitude que acreditamos ser a correta. Seja o que for, esse dilema exige decisões e cada uma delas traz consequências. A construção profissional se dá nos caminhos que a pessoa escolhe na prática. A gente toma decisões que traz arrependimento e pode voltar atrás e  aprendemos que a tal da "grande chance" não necessariamente é a última. As escolhas trazem consequências mas não necessariamente são definitivas.


Essa reflexão foi o que mais me cativou no gibi, após a leitura, a história ficou reverberando em minha mente a ponto de me distrair na leitura dos extras. Esse é tipo de reação ocorre em poucos quadrinhos e por isso a minha vontade foi sair dizendo a todos LEIAM TINA RESPEITO! A leitura conseguiu me fazer refletir sem utilizar de um discurso longo ou apelar para um longo caminho de sofrimento. O dilema de Tina é algo presente na vida de várias mulheres e muitas vezes é visto como uma situação natural e é isso o que mexe em mim como leitor e que me faz querer que algo ocorra para mudar aquilo.

Além do roteiro, a catarinense Fefê Torquato fez os desenhos. A artista tem um estilo cartunesco que utiliza poucos traços mas consegue ser muito expressiva neles. Muito do que vai ocorrer na história a gente consegue antever com a expressão facial dos personagens, numa sincronia entre o desenho e texto que só as histórias em quadrinho possibilitam. Um outro aspecto que me chamou a atenção nos desenhos foram as cores que a autora utilizam com a intenção de demarcar a figura e fundo da cena. Os personagens em diálogo têm as cores mais intensas enquanto o cenário tem cores neutras. Além disso, os desenhos demonstram uma sensibilidade de evitar a sensualizaçao da personagem, o que seria contraditório com as ideias do roteiro.

As discussões sobre várias problemáticas costumam ser tão superficiais que muitas vezes a arte pode levar a reflexões profundas que certos debates não conseguem alcançar. Tina Respeito mostra com isso que a igualdade de condições entre homens e mulheres no ambiente de trabalho é um mito. Infelizmente ainda temos que ouvir por aí políticos se referindo ao feminismo como "modinha". Vivemos num país em que a média salário das mulheres é 77,5%  do salário dos homens além de elas ainda serem vítimas das mais diversas formas de violência desde da sua casa, passando pelas ruas ou nos meios de transportes e indo até o ambente de trabalho. É por isso que falar sobre feminismo, que prega a igualdade de condições entre homens e mulheres, não é algo passageiro e nem uma virtude a ser admirada, é uma necessidade que se impõe numa sociedade que, quer queira ou não, traz em si a sua multiplicidade como característica e necessita que todos tenham as mesmas oportunidades, respeitando as suas características e as suas histórias de vida.

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